Artigos

Breves Considerações Sobre Compliance
na Área de Saude


Por Paulo Cesar de Almeida Filho, AHP Advogados.

Muito embora, o tema Compliance tenha adquirido maior notoriedade na maioria das Instituições com a edição da Lei 12.846/13, denominada “Lei Anticorrupção”, tem-se que, o mesmo não é novo.

Sem a pretensão de esvaziar o assunto, mas, de forma breve, cumpre salientar que, as atividades de compliance, cuja origem decorre do verbo inglês “to comply”, exprimem a idéia de estar em conformidade e cumprir os regulamentos internos e externos impostos às Organizações.

Permitindo-me não retroceder historicamente ao início do século XX, quando as grandes corporações americanas passaram a deixar de serem exercidas por seus próprios donos, e, seu capital passou a ser dividido entre acionistas, criando-se o Banco Central dos Estados Unidos, perpassando pela histórica crise mundial de 1929, com a quebra da bolsa de Nova York, chegamos ao que foi denominada “Era do Compliance”, quando em 1950, a Prudental Securities, contratou advogados com o intuito de acompanhar a legislação e monitorar atividades de valores mobiliários.

No Brasil, com a promulgação da Lei 9.613/98, que trata dos crimes de lavagem de dinheiro ou ocultação de bens, foi criado o COAF – Controle de Atividades Financeiras, tendo por escopo principal, o combate à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo.

No mesmo período, restou publicada a Resolução 2.554/98, dispondo sobre a implantação e implementação do Sistema de Controles Internos.

Posteriormente, em 2012, foi sancionada a Lei 12.683, que alterava a Lei 9.613/98, tornando mais eficiente a persecução penal dos crimes de lavagem de dinheiro.

Feito esse breve introito a respeito de parte do histórico das legislações aplicadas, friso, não tendo mencionado diversos outros diplomas legais, tendo em vista a objetividade que se busca com esse pequeno arrazoado, tem-se, por certo que, os resultados das ações de compliance demonstram o quanto uma organização está aderente às políticas, diretrizes, normas, regulamentos, legislação e procedimentos inerentes a atividade que exerce.

Nesse sentido, torna-se imperiosa a promoção da melhoria contínua dos serviços, diante de um Código de Conduta Empresarial, uma vez que, visa estabelecer regras de conduta para orientar as suas atividades tendo por escopo  evitar desvios de conduta no mercado corporativo, que juntamente com os Princípios de Governança Corporativa são hoje elementos altamente orientadores para a depuração do mercado de práticas não adequadas.

A título de ilustração, cumpre informar que, dentre os casos de maiores repercussões de fraudes, consta aquela identificada no Sistema de Saúde, no ano de 2012, cabendo ressaltar as mesmas são tidas como as maiores fraudes globais e bem maiores que aquelas praticadas contra o sistema financeiro, atingindo anualmente, cifras em torno de US$ 800 bilhões.

Segundo Célia Lima Negão e Juliana de Fátima Pontelo “in compliance, controles internos e riscos: a importância da área de gestão de pessoas”, somente os Estados Unidos, tiveram perdas de US$ 100 bilhões, tendo entre os crimes mais comuns, a falsificação de recibos de consultas, exames e cirurgias, chegando a lavagem de dinheiro, falsificação e conspiração contra o sistema de saúde.

Deste modo, tem-se que, a valorização das boas práticas de gestão e condutas exemplares nos negócios organizacional devem fazer parte de rígidos códigos de condutas, de escopo abrangente e genérico, posteriormente detalhadas por meio de políticas e/ou procedimentos internos.

Tais “normas”, devem ser seguidas da observância por seu cumprimento, visando detectar, e, se necessário for, tratar os desvios identificados ou ainda as não conformidades.

Ditos códigos de conduta devem conter seus objetivos e sua abrangência, tendo por Princípios a serem contemplados, a integridade, transparência, solidariedade, valorização do capital humano, respeito pelo meio ambiente, compromisso com a organização, relacionamentos construtivos e transparentes e liderança responsável.

Dentre as Diretrizes Principais, tanto para Estabelecimentos Hospitalares, quanto para os atores que atuem na área de saúde suplementar e por vezes complementar, deve-se estabelecer a gestão financeira, contábil e patrimonial, assegurando o fiel retrato da sua situação patrimonial, econômica e financeira, observadas as regulamentações vigentes, normas fiscais, dentre outras.

No mesmo sentido, quanto aos “incentivos”, preocupação que aumentou significativamente com a promulgação da Lei 12.846/13, devem ser mantidas e divulgadas políticas sobre atos impróprios, tanto de partes privadas, quanto de agentes públicos, podendo, e, se acaso, entendendo possível, devendo definir um valor máximo de incentivo permitido, listando situações de exceção.

Seguindo a mesma linha dos “incentivos”, deve-se proceder quanto as doações, onde não haverá de existir qualquer contrapartida.

Por fim, temos as comunicações e informações, onde nenhum colaborador deverá ser autorizado a falar em nome da organização, devendo preservar a confidencialidade, integridade e disponibilidade da informação.

Quanto ao relacionamento com as partes interessadas, deve-se cumprir rigorosamente as obrigações imputadas pelas legislações vigentes, evitando conflitos com autoridades governamentais e órgãos públicos.

A interação e relacionamento com pacientes, prezando pela qualidade e confiabilidade nos serviços prestados de forma individualizada e humanizada, observando os acordos e contratos firmados, os direitos e deveres daqueles, a confidencialidade das informações coletadas em prontuários, e, o envolvimento dos mesmos e seus familiares no cuidado e decisões a ele relacionadas, não podem passar ao largo.

Ponto de maior relevância, o relacionamento com fornecedores, onde o manual deve conter orientações, sempre prevalecendo o interesse institucional sobre o particular.

As informações relacionadas aos fornecedores devem ser tratadas de forma sigilosa, para não beneficiar empresas ou pessoas em quaisquer das etapas da negociação, a fim de que tenham igual oportunidade de participação e de condições nos processos de escolha, homologação e contratação, prestando-se os mesmos critérios nas escolhas de materiais hospitalares, medicamentos, OPME, imobilizados e outros materiais de consumo, conforme padrões técnicos definidos pela organização.

Por questões de ética, recomenda-se não contratar com parentes, ainda que colaterais, membros de conselho consultivo, diretores e afins.

O cultivo da prevalência da ética, do acesso as informações, do sigilo profissional, da prudência, do bom senso, da independência, da imparcialidade, da clareza, da meritocracia, torna a instituição mais sólida.

Organizações que possuem áreas de compliance, controles internos e de riscos demonstram ao mercado o comprometimento com o fortalecimento da organização e com a constante melhoria dos seus processos, preservando sua imagem perante a sociedade, clientes, acionistas e todos os demais stakeholders associados, evitando prejuízos advindos da falta de controle, contribuindo para a lucratividade da organização.

Nesse sentido, os programas de compliance visam conferir maior eficácia e eficiência ao cumprimento da legislação concernente a todas as leis e recomendações legais, a fim de evitar que a empresa sofra penalidades drásticas face ao descumprimento de tais normas. Além disso, essas novas ferramentas, também conhecidas como “programas de integridade”, podem alavancar a produtividade e o crescimento das organizações, contribuindo também para melhorar ou preservar a boa reputação das mesmas.

De forma sucinta, pode-se definir compliance como uma espécie de guia contendo diretrizes para que todo o corpo organizacional – do diretor ao estagiário, alcançando, inclusive, os stakeholders – cumpra as leis e as normas internas. A finalidade maior é estabelecer no ambiente institucional uma cultura da integridade, orientando todos a agir com correção, ética e transparência. Outrossim, o compliance ambiciona prevenir desvios e irregularidades que possam afetar a imagem e a credibilidade dessas entidades.

Como os planos de saúde são efetivados por meio do estabelecimento de um contrato entre as partes, é imprescindível que operadoras e beneficiários sigam rigorosamente os termos das cláusulas contratuais.

O Código Civil e o Código de Defesa do Consumidor são claros ao afirmarem que, se o contrato for adesivo e abusivo ao mesmo tempo, ou se determinada cláusula for omissa, a interpretação jurídica será em prol do consumidor.

Por essas razões, dentre outras, é aconselhável que as operadoras de planos de saúde, hospitais e demais prestadores, bem como todos aqueles que transitem pelo segmento invistam em profissionais qualificados, que sejam capazes de elaborar contratos objetivos e inteligíveis, buscando garantir segurança jurídica, bem como prevenir a denominada “judicialização do contrato”, que pode custar alguns milhões de reais para as partes. Nesse contexto, a implementação de um bem estruturado departamento de compliance é quase uma exigência para que as orientações legais e normativas no que tange a esse tipo de transação também sejam estritamente observadas.

Ademais, as organizações que não instituírem programas de compliance correm o risco de perder mercado e, ainda, de eventualmente responderem pelo não cumprimento da legislação como um todo nas esferas cível, administrativa e penal. É acompanhar a tendência das instituições ou, literalmente, ficar para trás!

Paulo Cesar de Almeida Filho é advogado e sócio AHP Advogados.